terça-feira, 28 de julho de 2009

Não confunda "Seu cuca é eu" com "seu cu quer eu"

Conversar com pessoas mais velhas do que nós é sempre um grande aprendizado. Lições de vida, conselhos, sermões e principalmente o conto de histórias nos faz ter uma noção de como o passado era tão distante do presente e se distancia ainda mais do futuro.

Em uma dessas conversas, tive uma percepção de como eram aplicadas as provas de antigamente. Nada de Provas, testes, Enem, Vestibular, Programa seletivo, nada disso. Antigamente (mas bem antigamente), a prova de “cultura popular”, cátedra que existia à época – e na minha opinião, precisa voltar a existir, quando soube sua função – consistia em um exame oral de temas diversos sobre o cotidiano popular. Uma riqueza de cultura.

No caso específico, o jovem (hoje com idade para ser meu avô), iria se submeter a um teste em que lhe questionariam acerca dos ditados populares. O jovem estudou dois deles: “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura” e “Mais vale uma pomba na mão do que duas voando”. Na ocasião, deveria ditar os dois de forma rápida e depois explicar a origem e sua aplicação prática no dia-a-dia. Algo muito fácil e tão inexpressivo nos dias de hoje, mas que servia para que os jovens da época valorizassem cada vez mais a sabedoria do povo, algo tão raro atualmente.

Então, percebe-se que eram duas fases. E eliminatórias. Na primeira, deveria ditar os dois ditados que estudou de forma rápida e sem cometer erros. Na segunda fase (caso aprovado na primeira), teria que explicar cada um deles.

Escolhido os ditados e pesquisado tudo sobre eles, o jovem estava com o histórico de ambos na ponta da língua. O cuidado agora era apenas para não errar quando fosse ditá-los de forma rápida. E assim o jovem passou a semana toda treinando de frente para o espelho: “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, “Mais vale uma pomba na mão do que duas voando”, : “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura” “Mais vale uma pomba na mão do que duas voando”, “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, “Mais vale uma pomba na mão do que duas voando”.

- Meu filho, vá descansar – dizia a mamãe preocupada vendo o esforço do filho - você já está aí há muito tempo, tenho certeza que vai se dar bem.
- Vou mamãe, mas “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura” e “Mais vale uma pomba na mão do que duas voando” - respondia o serelepe garoto.

No dia da prova, havia mais três garotos com ele. Os outros dois haviam escolhidos temas diversos, como Folclore ou sobre a história de algum artista popular. Só ele havia escolhido os ditados. Ele era o último. Os três ficavam numa antesala esperando serem chamados.

Após verem, um a um, os dois saírem da sala com a notícia de suas aprovações, o jovem ouviu seu nome ser chamado, convidando-o a adentrar na sala onde ele seria examinado. Ao entrar, vê três professores sentados de frente para ele. Segue-se o diálogo.

- Bom dia jovem, qual tema você escolheu de cultura popular?
- Bom dia, professores, escolhi “Ditados Populares”.
- Pois não – passou a explicar o professor – queremos que você diga os seus dois ditados de forma rápida para nós. Caso consiga fazer isso, você estará aprovado para a segunda fase, quando deverá nos contar a história de cada um e a sua importância prática no nosso dia a dia.
- Pois não, professor – respondeu o jovem, com uma certo ar de segurança.
- Pode começar.

O que ele não sabia até aquele momento é que o ser humano tem alguns momentos de lapso, de confusão de memória, causado algumas vezes por situações em que se está sob pressão, tal qual aquela situação em que ele estava agora e pela qual nunca havia passado antes.

Sentiu, como nestes momentos, as pernas tremerem e os braços balançarem e as palavras simplesmente fugirem da sua cabeça. Não se lembrava mais de nada. Tentou começar:

- Mais vale... – balbuciou, sob o olhar dos professores.
- Mais vale uma ...- continuou, trêmulo, enquanto os professores já começavam a aparentar nervosismo..

Parou por 10 segundos, fechou os olhos, tentou buscar as palavras no fundo da memória. Viu que havia conseguido alguma coisa, respirou fundo e disparou rapidamente, como era exigido no exame:

- MAIS VALE UMA POMBA DURA NA MÃO DO QUE DUAS MOLES FURANDO UMA PEDRA!!!

Estava tão nervoso que não conseguiu entender sequer o que ele próprio havia dito, razão pela qual não entendeu quando a professora da esquerda mandou ele ir embora daquele lugar, chamando-o de moleque depravado..


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